12/01/10

Caça às bruxas?

Nos últimos dias, a imprensa, a OAB e, consequentemente, a opinião pública se deliciaram com a notícia acerca de eventuais irregularidades no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

O já ex-presidente (e nada saudoso), desembargador Vallim Bellochi, na cerimônia de posse do novo dirigente, desembargador Vianna Santos, trouxe à tona dados que, da maneira como apresentados, ferem a imagem de todo o quadro de servidores, não só do judiciário, mas de todo o setor público. Pelas informações ali expostas, cerca de 5.000 funcionários do TJ, de um total de 44.000, estariam afastados por motivos de saúde, sendo que aproximadamente metade destes afastamentos seriam, supostamente, irregulares. Noticiou-se de tudo: servidores afastados e residindo no exterior, servidores afastados e trabalhando em outros órgãos, até assédio sexual a médico para conseguir atestado.

Mas, quem são, exatamente, tais servidores? Não conheço ninguém em tal situação, nem servidores com condições de morar no exterior com o salário do Tribunal, como mencionado, nem servidores afastados e trabalhando em outros órgãos, nem servidores afastados mediante fraude. Pelo contrário, conheço, sim, servidores doentes, vítimas da sobrecarga e das condições de trabalho impostas. Talvez, tais irregularidades, se verídicas, estejam bem mais próximas da cúpula do TJ do que da “senzala”.

E qual o motivo do ex-presidente trazer a tona tal situação exatamente no encerramento de seu mandato? Talvez, a última chance de deixar uma boa impressão face a inércia de dois anos no comando. Ou talvez atribuir aos trabalhadores a culpa da situação que se encontra o TJ, perante a facilmente manipulável opinião pública. E o novo presidente, Vianna Santos, disse que não haverá “caça às bruxas”, mas a “caça” já começou. Infelizmente, com tais denúncias o senso comum condena todos os servidores, jogados numa mesma vala comum dos imprestáveis.

Outro fato intrigante é a preocupação do Tribunal com quem recebeu e não trabalhou, mas não existe a mesma preocupação com quem trabalha e não recebe. Existem servidores com haveres desde 2001, relativos à férias não gozadas por necessidade de serviço. A reposição anual da inflação, direito de todo trabalhador, que deveria ter ocorrido em março de 2009, já está completando quase um ano de atraso. O orçamento para 2010 não prevê sequer tal reposição. Possivelmente ficaremos dois anos com defasagem, fora as já devidas e reconhecidas, de anos anteriores. O Legislativo ignora os projetos de lei que beneficiam os servidores, parados há anos, ao passo que os que favorecem os magistrados são aprovados rapidamente.

Enquanto isso, a OAB, a imprensa e a opinião pública continuam, ao contrário do novo presidente, Vianna Santos, “caçando as bruxas”, mas não demonstram a mesma atitude com relação às irregularidades no comando do Tribunal de Justiça. As associações de classe fizeram inúmeras denúncias no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), algumas graves, que envolvem até crime de ordem tributária e improbidade administrativa. OAB e imprensa, nenhuma manifestação, opinião pública, consequentemente, sequer fica sabendo.

Resta aos servidores a esperança de que o novo presidente, ao contrário de seu antecessor, não permita que a corda arrebente do lado mais fraco. E só. Da OAB, da imprensa e da opinião pública, pouco se espera.

Texto divulgado no blog Servidores do TJ-SP - http://servtjsp.blogspot.com
Por Gleison Zambon